sábado, 22 de dezembro de 2012

To na área! (Tchê!!)

Local de postagem - Arroio do Sal (10km de Torres - RS)


Cruzei a minha primeira fronteira estadual.

Sim, estou a cerca de 3 semanas sem postar algo aqui. Então vou resumir em duas linhas o que rolou neste quase um mês.

1-Fiquei duas semanas parado;
2-Cruzei a fronteira entre Santa Catarina e Rio Grande do Sul.

Saí de Urussanga eu segui até Araranguá, no caminho eu passei em um restaurante em Içara chamado Maristela e ganhei um almoço de rei.

O banquete (esq.). Fachada do restaurante (dir.).

Já em Araranguá, onde eu reencontrei um grande amigo e conheci a sua queridíssima esposa Thaís Wachholz que me receberam super bem. Inclusive me receberam de uma forma tão especial, que eu até deixei a bicicleta lá e fui abduzido.

Em abdução =)

Duas semanas depois eu voltei da abdução para Araranguá e parti sentido o Rio Grande do Sul. Como estava muito tempo fora de forma, fiz em duas etapas. Entre Araranguá e Torres-RS, eu parei em um vilarejo perto de Sombrio-SC. Lá quando eu fui pedir informação em um posto de gasolina, estava um calor infernal! E o tempo estava começando a virar, e virou! Uma sequencia de rajadas de vento destruiu a cobertura do posto onde eu ia pedir a informação.


Resultado de uma sequencia de rajadas de vento, testemunhei tudo.

Pernoitei no pequeno vilarejo atrás de uma igreja e no dia seguinte eu segui sentido a Torres para encontrar um amigo mociclista viajante também que conheci em Orleans-SC.

Divisa SC/RS

Ele havia dito que se caso eu passasse na região, para eu avisá-lo e aqui estou. Também muito bem recebido, e pegando várias dicas das viagens que ele ja fez.

Humberto cuidando dos cachorros da rua dando comida,
acompanhando ferimentos e os protegendo

Agora eu me preparo pra sair daqui no dia 24 e seguir sentido a Tramandaí, Osório, Lagoa dos Patos e etc...

Logo! vou passar o natal na estrada e acho que não vou conseguir falar com nenhum de vocês nos próximos dias. Então deixo aqui a todos vocês meus votos de feliz natal!



Um breve agradecimento a:

Toda a guarnição dos Bombeiros de Urussanga-SC. Em especial o Baptista e o Rafael!
Restaurante Maristela (Dinarte)
Daniel e Thaís (pelo todo o carinho)
Casaugusto e Alex Coelho pelo help!
Sarah (Vielen Danke meine Lieber!)
Humberto pelas dicas e hospedagem

618km rodados no odômetro

terça-feira, 4 de dezembro de 2012

domingo, 2 de dezembro de 2012

Baptismo de Fogo


Local de postagem: Urussanga – SC (aprox. 40Kms de Criciúma)

Eu sempre bato papo com a minha mãe pelo celular. A bateria do dele não dura muito quando eu to usando a internet. Eu tenho que desligar o celular várias vezes durante o dia para economizar e ainda sou um caça tomadas. Para você ter ideia, aquela bolsa que fica no quidão da minha bicicleta contém as coisas que uso com mais frequência, mapa, carteira, celular e até o carregador fica nela. As vezes eu conto um pouco do meu dia pra minha mãe pelo whatsapp [+55(41)8523-6296] quando eu tenho tempo. Me passou agora se eu postasse tudo o que eu digo pra ela, aqui no blog. E me paraceu uma boa ideia.

Senta que la vem a história...


Bom, estava em Urubici e pretendia seguir sentido São Joaquim. Mas procurei me informar das possibilidades que eu tinha, além de São Joaquim eu descobri a Serra Corvo Branco. Essa serra, inteira não-pavimentada, tem seu início à uns 1700 metros de altura (se não me engano, de memória) entre Urubici e Grão Pará, ambas em Santa Catarina. Essa serra liga a região serrana de Santa Catarina ao litoral. Seu começo (no ponto mais alto) foi talhado em uma pedra, por um homem chamado Pedro Kunhen que posteriormente foi homenageado, assim, a estrada se chama Pedro Kunhen. Literalmente um rasgo de 90 metros na rocha (também, de memória), é o maior corte vertical entre dois paredões feito em uma rocha no país, e os caras na época fizeram na raça e no lombo do jegue!!!!  Logo em cima do Aquífero do Guarani. Existe inclusive um fenômeno de cada lado destes paredões se colorem de formas opostas devido a umidade do aquífero. Ao mesmo tempo, você sente a brisa do mar que está bem longe se colidindo com o primeiro desfiladeiro da serra. Eu tinha até uma foto da placa do memorial que há lá em cima, dentre outras.

Então decidi subir e descer esta Serra do Corvo Branco. Subi de Urubici até o topo da Serra, num chão muito solto de terra e cascalho sobre um sol escaldante (estava a muitos dias sem chover), com pouca água e com um monte de marimbondo pousando em mim toda a vez que eu parava na sombra durante a subida. Eu amarrei um lenço no meu rosto e molhava constantemente por causa da poeira.

Lá em cima, curti o visual e curti o local onde o vento do litoral se choca com a serra. (por acaso, você pesquisou sobre o fenômeno que eu falei?? Caso, não, o que está esperando???). Volta e meia alguém parava por lá também. Inclusive parou um casal e eles tiraram uma foto minha com a bicicleta na câmera deles. Queria encontrá-los para pegar o único registro que eu tenho daquela lugar.

Fiz a decida, que é fenomenal. Mas como eu estou com muita carga, a estrada não é pavimentada e está muito esburacada com muita pedra solta, foi muito perigoso e eu tive que segurar muito no freio. Houve uma hora que eu parei para encher minhas garrafas em uma nascente e senti o cheiro das pastilhas de freio queimadas de tanto frear. Para ser bem sincero, no quesito curtir descida, eu fiquei mais na psicose da trepidação com meus alforges do que curti a descida propriamente dita. Eu parava sempre que uma daquelas curvas cinematográfica me davam uma boa vista e tirava uma foto. Até que notei que estava parando demais e já estava ficando escuro.

No pé da serra, saí no distrito de Aiurê, que pertence a cidade seguinte: Grão Pará. Tudo chão batido, lugarzinho micro, muito simples. Como sempre, em todo mercadinho eu dou uma parada, encho minha garrafinha, aproveito para repor algo que está em falta no meu estoque e, claro, sou metralhado de olhares. Sinto uma salada de olhares, uns me olham como um extra terrestre, outros como alguém pagando promessa, alguns me olham como um inspetor bugiganga e tem gente que me acha um Amir Klynk; É sempre assim. Segui a viagem e quando a noite já estava começando a cair, passei na frente de um lugar que tinha uma placa de informações e parei pra pedir um quintal para armar minha comunidade e brincar de casinha. Norma, que me atendeu, foi muito simpática, me apresntou seu marido e eu logo logo reparei que eu tava em um engenho de cana. Era um lugar turístico, onde podia até comprar e degustar açúcar, cachaça e licores de cana produzidos no próprio engenho. Perguntei o nome do engenho, e para meu espanto:

-Engenho Pedro Kuhnen – disse Norma

Até então eu não sabia que esse era o nome da rodovia. 

-Esse cara deve ser bem famoso por aqui – eu retruquei
-Lá em cima, quando você viu a placa do corte da pedra, qual era o nome que tinha lá??
-Não sei.
-Pedro Kuhnen, meu pai.

Meu queixo foi no chão. Simplesmente ficamos o resto da noite eu, ela, o marido dela bebendo cachaça (e licores) e conversando. Ela até me ofereceu uma janta, mas depois de eu contar um pouco da minha rotina eu vi que ela tinha tanta curiosidade de ver como eu cozinhava o meu macarrão que eu preferi fazer um macarrão na mesa do quintal dela. Tudo sobre os olhares dela e o marido não desgrudavam os olhos de cada tempero, vidro de azeite que eu tirava do alforge e de cada panela, talher, fogareiro e canivete que se desdobrava.

Terminei de cozinhar comi e já era tarde, eles foram dormir e eu fui tomar um banho para também dormir.

No dia seguinte saí por volta do almoço, me despedi e acho que após 2kms de ter saído do engenho, ainda numa descida na estrada de terra, por volta de 38km/h a roda da frente entrou em um morrinho de terra, perdeu o “grip” e saiu de lado. Eu tentei trazer o guidão de volta, mas o peso dos alforges da frente não me deram agilidade suficiente e eu trouxe demais. Fui sambando de um lado para outro umas 5 vezes, até que caí no meu lado esquerdo. 

Ralei todo o lombo esquerdo, da bunda ao ombro. E dilacerei o cotovelo e o punho. Verifiquei a bici, me verifiquei, limpei o ferimento com a água que eu tinha e continuei pela estrada de terra por 11kms até Grão Pará. Lá fui no posto de saúde, tirei uma foto do ferimento para acompanhar a cicatrização, fui atendido e parti para a próxima cidade. 700 metros a frente dalí eu vi uns muleks de uns 12 anos num quiosque de pastel com umas bikes muito pequenas e engraçadas, brinquei se trocavamos. Parei e subi em cima de uma. Eu parecia um macaquinho de circo em uma bike micro. Decidi tirar uma foto. Foi quando me dei conta que não estava mais com a câmera. Já digo na sequencia que acho EXPRESSAMENTE impossível de qualquer pessoa daquele posto de saúde ter me levado a câmera. Acho que não guardei direito, deixei em cima do caixote traseiro solta e ela caiu nesses 700 metros. Alguém deve ter achado e pego. Quando eu reparei que estava sem a câmera, eu fiz o caminho de volta, olhei em baixo de todos os carros e perguntei para todas as pessoas na rua. Tudo isso em vinte minutos. Foi muito rápido. Me senti muito mal, dei uma geral na bici ali, no meio da rua, chorando desesperado. Inclusive eu que estava partindo naquele momento decidi arrumar algum lugar para passar a noite na cidade. Achei uma madeireira para dormir e, assim quem sabe procurar, ou ser procurado para entregarem a câmera. Nada feito. Até o dono do posto ligou para o locutor da rádio local para avisar os ouvintes durante a programação.

Dormi na madeireira, em cima duma mesa por causa da poeira. Ao lado de um cavalo. Num poeiral sinistro. Mas tava bom. Estava abrigado, longe da rua e minhas coisas em segurança.

Dia seguinte eu acordei e fui embora. Detalhe, não tinha sinal da tim desde de a saída de Urubici até esse ponto.

Segui viagem até São Ludgero. Lá, eu estava muito cansado e muito bolado (ainda to) com a perda da câmera, a queda e todo o pacote de Batismo de Fogo que eu havia passado nas ultimas 24hs. Continuei meu caminho e reparei na beira rodovia havia umas cadeiras. Como se fosse umas cadeiras de madeira de um telhado, sem muro, um quioscão. Era uma capela de nossa senhora. Já estava chovendo muito a algumas horas, e eu pensei em ficar por ali. Cheguei lá e procurei o zelador dela, que mora numa vila logo atras e pedi pra dormir lá, na capela na beira da rodovia. Armei meu saco de dormir, na frente mesmo do altar e deitei.
Toda hora (durante toda a madrugada inclusive) chegava alguém pra ascender uma vela e rezar, a luz ficava acesa e todo mundo me via, via a bici e minhas tralhas. Até os caminhões e carros que passavam na rodovia conseguiam me ver. Foi uma paranóia, eu estava coberto, salvo da chuva mas não tinha banheiro, tava na beira da pista e não tava me sentindo seguro.

Depois que eu mudei de caminho, em direção a Criciúma, as cidades foram crescendo, se tornando mais industrializadas e eu não sentia a segurança que tinha na região serrana. Tudo mais hostil.

O dia amanheceu e nada aconteceu. Peguei minhas coisas e segui em frente. Mais uma subida até Orleans e passei pelo portal de entrada da cidade. Foi a primeira cidade que eu passei e não fiquei, sequer entrei. Uma sensação estranha de estar deixando alguma oportunidade pra trás. Mas eu num tava numa vibe boa e continuei, só queria tocar pra frente, mais e mais. Parei num posto para comer meu almoço: dois sanduiches de creme de avelã e cacau com banana, uma tangerina, um punhado de castanha do pará, de cajú, uva passas e meio litro de água de coco. Conheci dois motociclistas (um em uma BMW e outro em XT600) que haviam feito o mesmo caminho que eu e logo vieram os elogios.

-Nossa! Você é sinistro! - um disse
-Puta que pariu! E ainda mais com esse peso todo – disse o outro

Um deles mora em Torres, divisa de SC com RS e ofereceu pouso se eu passar por lá.

Insight: Eu acho que não melhor presente, oferta nem nada melhor que saber que em certo lugar você terá um banho quente, uma possibilidade de dormir sem chuva, em segurança, podendo lavar suas roupas e dar uma geral nas coisas.

Eles seguiram o caminho deles e eu segui o meu. Cheguei no mesmo dia em Urussanga e vi um quartel dos bombeiros. Lembrei dos bombeiros que me acolheram em Bom Retiro (to devendo essa parte da trip, um dia eu conto) e pedi pouso pra eles. Como sempre, falam com o cabo, que fala com o soldado, que fala com o sargento, que fala com comandante e, claro, nem todos estão no quartel. Um deles, antes de obter a resposta do comandante se eu podia ficar lá, me ofereceu um pouco do almoço deles, uma costelinha incrível com maionese e purê de aipim. Então depois de uma espera, consegui arrumar um lugar para ficar. Dei uma geral na bici, tomei um banho e lhes escrevo isso agora.


Alerta:
Entendam que eu estou na estrada, e todas as informações que eu escuto são dos populares. Não tive tempo e provavelmente não irei confirmar cada um desses dados e histórias que escutei e estou retransmitindo aqui.